Num dia certo de um calendário antigo, estava a passear por um bulevar ao longo do rio Mississipi, fazendo hora para dirigir-me ao aeroporto, quando decidimos (Cláudio e eu) entrar num shopping envidraçado que surgira ao longo de nossa caminhada. Percorremos devagar e despreocupadamente as alamedas de lojas e os saguões. Relembro com nitidez a amplidão da nave central do prédio que abrigava dezenas de quiosques e lojas de artigos finos, sem nem de longe pressentir que naquele mesmo dia um navio desgovernado deslizaria sobre aqueles mármores – arrebentando tudo, lógico.
Foi com horror que vimos as cenas replicadas em todos os aparelhos de TV do aeroporto de Nova Orleans, já com os cartões de embarque para São Paulo nas mãos. O navio doido foi rasgando a rua até atingir o bulevar e logo em seguida invadir o shopping onde estivéramos horas antes, ocasionando uma quebradeira de vidros e de paredes estonteante. O pânico fez as pessoas correrem em todas as direções, como um enxame de formigas descontroladas. É muito esquisito ser atropelado por um navio dentro de um shopping americano.
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Todo este preâmbulo porque na sessão da tarde de ontem revi o Encouraçado Potemkin, o filme que está para os russos como o Cidadão Kane está para os americanos. Achei uma cópia precária no desorganizado armário dos filmes no quarto de cima, com legendas em inglês e imagens desgastadas pelo tempo. Obra de um dos pais da arte cinematográfica, Sergei Eiseinstein, foi feito em 1925, quando o cinema ainda não tinha som. Conta a história de um motim de marinheiros (1905) que se rebelaram contra os oficiais do navio - o estopim foi uma sopa feita com carne estragada. A edição é uma obra-prima, faz a fita parecer tão ágil quanto um filme de ação contemporâneo.
Todo este preâmbulo porque na sessão da tarde de ontem revi o Encouraçado Potemkin, o filme que está para os russos como o Cidadão Kane está para os americanos. Achei uma cópia precária no desorganizado armário dos filmes no quarto de cima, com legendas em inglês e imagens desgastadas pelo tempo. Obra de um dos pais da arte cinematográfica, Sergei Eiseinstein, foi feito em 1925, quando o cinema ainda não tinha som. Conta a história de um motim de marinheiros (1905) que se rebelaram contra os oficiais do navio - o estopim foi uma sopa feita com carne estragada. A edição é uma obra-prima, faz a fita parecer tão ágil quanto um filme de ação contemporâneo.

Outra imagem inesquecível é o guarda sol branco aberto que vem na direção da câmera e, como uma cortina, cobre a visão do espectador. Os planos seguintes são rápidos e mil imagens se abrem aos olhos do público: uma mulher tropeça; um aleijado se joga escada abaixo apoiando-se nas mãos; as pessoas correm em todas as direções, muitas são atingidas pelos tiros e vão caindo como moscas.
Um filme de impacto tão forte que mal se termina de ver dá vontade de recomeçar a sessão.
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Sergei Eisenstein |
2 comentários:
Nos anos 70 o Encouraçado era quase um estandarte da resistência. Além das qualidades cinematográficas, tinha a grande vantagem de ser transgressor, pela origem e pela temática.
E a gente aproveitava prá respirar um pouquinho.
Que tempos, hein?
Lembro bem, M.Jo.
Sem saudades...
bjs
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