“Um álbum que reúne fotografias, recortes,
flores secas e até mesmo uma mosca imprensada entre as páginas”: é assim que
Ettore Scola descreve seu último filme “Que estranho chamar-se Federico”. O diretor octogenário volta ao passado para
contar um pouco de sua infância, sua amizade com Fellini desde o tempo de “artista
de jornal” , como a obra do mestre de Rimini esteve presente em toda sua obra e
como marcou definitivamente o cinema italiano e
mundial. Filmado inteiramente no Estúdio 5 da legendária Cinecittà,
onde Fellini criou a maior parte de sua
obra, Scola faz um “retrato cubista” de Fellini.
No início o espectador se depara
com o jovem Federico (então com 19 anos) chegando à redação do jornal
humorístico romano “Marco Aurélio”, onde não apenas escreveu, mas se tornou “ghost
writer” de seus colegas. Cinco anos mais tarde, seria a vez do próprio Ettore
chegar à redação com seu portfólio debaixo do braço. Foi assim que começaram a
amizade que perduraria pela vida. Ambos tinham o gosto pelo design,
frequentavam os mesmos bares e tinham um grande amigo comum – Marcello Mastroiani,
o ator predileto desses dois grandes diretores da “italianice”. Essa convivência permite a Ettore aprofundar o
retrato das manias do amigo. Quando tinha insônia Federico entrava em seu
automóvel e fazia longos passeios noturnos pelas ruas de Roma em busca de sono
e de inspiração, dando caronas a desconhecidos que abordava nas ruas. Em uma
das cenas mais emblemáticas entra no carro a prostituta Wanda cujas desgraças
lembram a personagem imortalizada pela atriz
Giuletta Massina, em “Noites de Cabíria”.
Palhaços, mágicos, mulheres de
seios fartos, figuras bizarras, os cinco Oscars que Fellini ganhou, tudo é relembrado
através de pedaços de filmes, entrevistas, a música de Nino Rota. Até a capacidade de Federico para reinventar
suas memórias, como visto no documentário “Fellini: sou um grande mentiroso”. Gostava de contar, por exemplo, que aos 5 anos
tinha fugido de casa para se juntar à trupe de um circo o que nunca aconteceu.
Gostei especialmente da montagem
no final do filme, feita a partir de imagens das obras-primas de Fellini. Uma
homenagem apaixonada que faz o espectador nem tanto “entender” Fellini, mas experimentar
um pouco de sua fabulosa imaginação.