sábado, 21 de janeiro de 2012

Santo André -- verão de 2012.

Caríssima amiga,
foto de Luis C. K.
                  O laconismo de suas mensagens ainda consegue me surpreender – e me fazer sorrir.  Três linhas – e uma boa pergunta: “nas ocasiões que decidimos mudar a rota da vida, estamos sendo corajosos por fazê-lo, ou covardes por não agüentar o tranco?”.  Acho que a resposta vai depender de quem responde: ou seja, depende do caso.
Não há regra geral, eu argumentaria..
Rene Magritte

POR OUTRO LADO...
Esta semana comecei a organizar os livros que serão doados durante o processo da mudança.  Quem nunca mexeu numa estante de livros e viu-se presa do lugar, dependurada nos títulos, limpando as lombadas, admirando as capas, enternecendo-se com as dedicatórias dos livros escritos ou dados de presente pelos amigos, relendo as estranhas anotações feitas anos atrás, lendo as orelhas e a contracapa?  Uma parte de nossa biografia está lá nas estantes, nos prefácios, nas notas-de-rodapé. Aos mais frágeis, recomendo a presença de um analista amigo enquanto durar a operação. Foi assim que comecei a ler um livro-ícone dos anos 80 – “Tudo que é sólido desmancha no ar”.  A s linhas da introdução estão rabiscadas, não por mim; parece a letra de minha irmã.  O tema do autor é denominado “a aventura da modernidade” – observe-se que o título foi retirado de um  trecho de Karl Marx no “Manifesto Comunista” – onde se lê:
Todas as relações fixas, enrijecidas, com seu travo de antiguidade e veneráveis preconceitos e opiniões, foram banidas; todas as novas relações se tornam antiquadas antes que cheguem a se ossificar. Tudo que é sólido desmancha no ar, tudo o que é sagrado é profanado, e os homens finalmente são levados a enfrentar (...) as verdadeiras condições de suas vidas e suas relações com seus companheiros humanos.
revista Life: São Paulo, 1939
O autor parece estar querendo dizer algo sobre essa pergunta do ficar ou partir. Será? Olha este trecho:
Para que as pessoas sobrevivam na sociedade moderna, qualquer que seja a sua classe, suas personalidades necessitam assumir a fluidez e a forma aberta dessa sociedade. Homens e mulheres modernos precisam aprender a aspirar à mudança: não apenas estar aptos a mudanças em sua vida pessoal e social, mas ir efetivamente em busca das mudanças, procurá-las de maneira ativa, levando-as adiante. Precisam aprender a não lamentar com muita nostalgia as “relações fixas, imobilizadas” de um passado real ou de fantasia, mas a se deliciar na mobilidade, a se empenhar na renovação, a olhar sempre na direção de futuros desenvolvimentos em suas condições de vida e em suas relações com outros seres humanos.”
dorothea tanning
Curioso, para você que conhece bem o entorno onde moramos, é que estávamos hoje na praia do Guaiú, comendo guaiamuns e tomando cerveja com Regina e Rita e deu que junto com as duas irmãs estava Sílvia, a fotógrafa paulista amiga de Ricardo Woo que veio para fotografar a entrada do ano do dragão (Woo é metade chinês, metade japonês, como bem sabe). Três dias de festa ininterrupta, no ateliê dele em Mojiquiçaba, começa hoje. Parece-me que amanhã será o clímax do evento e que haverá uma performance ousada do Woo – me informaram que o fogo vai rolar no imenso chapéu de piaçava que ele vestirá e nas peças de cerâmica que fabrica. Promete ficar no calendário. Espero que nosso amigo sobreviva!
Toda esta parte do Guaiú é para dizer que no meio da conversa a Sílvia citou – dentre tantas possibilidades -- justamente este livro que retirei da estante para ler; precisamente o livro de onde retirei as citações acima. Será que o universo manda sinais?
Ricardo Woo
Tudo que é sólido desmancha no ar.  
Tudo que começa, acaba -  só para recomeçar outra vez. 
Abraço: bom final de semana!

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