sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

rotas cruzadas na praia de santo andré


Nunca os vira no povoado. Passo a passo, a história daqueles dois foi se desvelando durante as caminhadas com os amigos pela orla marítima.   Contaram-me que os dois visitantes tinham sido amigos -- até o momento em que um forte desentendimento rompera a aliança fraterna; e ninguém sabe a razão.  Tanto tempo se passou na rota daqueles caminhos divergentes – um deles mora fora do Brasil há décadas. Até que a ventura -- sempre ela -- quis que escolhessem justamente Santo André da Bahia para o desfrute de alguns dias ao sol deste verão. Num vilarejo de poucas ruas, meia dúzia de becos e quatro praias desertas, o encontro foi naturalmente inevitável.  Por trás dos panos surgiu uma torcida discreta pelo reatamento daquela amizade.   Um dia encontrei-os na praia: primeiro avistei o de cabelo longo – chegamos a conversar por alguns minutos. 
 (Na noite clara do dia anterior havíamos compartilhado a refeição na casa de amigos em comum: numa mesa posta para jantar ao ar livre e à luz de uma memorável lua cheia).  
Só conheci de perto o segundo personagem porque minhas amigas foram até a pousada dele para as despedidas.  No breve encontro que se seguiu, abriu o sentimento e não pude deixar de ouvir: queria falar com o antigo amigo, cumprimentá-lo, esquecer a mágoa...
Não foi desta vez.
Quem sabe na próxima estação.
De qualquer maneira fiquei desconcertada porque quando cheguei em casa abri a página de um blog literário e encontrei um poema do português Gastão Cruz que me  pareceu desenhado exatamente para aquela ocasião.  
foto de Guiomar Eduardo de Paula
"Passou a alguns metros de onde eu
estava; não o via
há anos e nem sei
qual a última vez que com ele falara

Não o reconheci de imediato e bastou
essa dúvida para criar um hiato
na linha dos olhares de repente cruzados
dentro da tarde; receara

decerto não ter sido por mim reconhecido
enquanto que eu não fora já a tempo
de lhe mostrar que o vira e me lembrava
do seu rosto mesmo que um pouco menos

luminoso que outrora; e um remorso
absurdo me tomou por ter perdido
esse olhar hesitante
no desconcerto breve de uma tarde"

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