Entrei no ônibus de olho na única cadeira
vazia -- o percurso da praia até Palermo levaria cerca de meia hora e as
curvas da estrada desequilibram os passageiros que viajam em pé.
Sentei defronte uma criatura de olhos pretos que trazia junto
aos pés um enorme pacote transparente cheio de bolas de plástico. Um
rapaz franzino, de tez morena, vestindo roupas folgadas de algodão
branco, parecia um vendedor ambulante. Conversava em língua estranha com
pessoas que estavam perto da porta. Ouvi alguém comentar em inglês que
eram imigrantes de Bangladesh. Logo depois me levantei para passar meu
bilhete na maquininha que fica atrás do motorista e perfura a passagem;
quem não toma essa providência arrisca-se a pagar uma multa cara, se o
fiscal aparecer. Tentei inserir o bilhete repetidas vezes, a máquina
estava emperrada. Notei que o rapaz acompanhava meus movimentos com o
olhar. De repente levantou-se, pegou minha passagem, fez outras
tentativas mal sucedidas. Pedi o bilhete de volta para ler o que estava
escrito. Dizia em letras miudinhas que em caso de enguiço da máquina, o
passageiro deveria escrever o dia e a hora do embarque no próprio
bilhete. Foi o que fiz, e voltei a me sentar. O rapaz bengalês não teve
a mesma sorte, um homem sem cerimônias sentou na cadeira dele sem se
importar com as bolas de plástico. A viagem prosseguia sem novidades
quando o jovem voltou a se aproximar de mim com o bilhete dele na mão.
Parecia aflito. Procurava ultrapassar a barreira da língua com gestos
que eu não conseguia compreender. Para complicar, o homem que tomara o
assento dele pôs-se a falar comigo em italiano. Dizia-me com veemência
para desconsiderar o pedido do rapaz, mal ocultando a raiva. Talvez não
gostasse de imigrantes, não sei. Olhei para os olhos do rapaz bengalês –
e é este momento que ainda me assombra – os olhos mostravam
desapontamento e mágoa. Pareciam dizer “perdi meu assento tentando lhe
ajudar e você me deixa na mão?” Imediatamente vi os dois fiscais
dentro do ônibus e finalmente entendi o que o jovem me pedia: para
escrever a data e a hora no bilhete dele. Não sei se ele não tinha
caneta ou se não sabia escrever. Rabisquei a data apressadamente, um
pouco antes dos fiscais pedirem nossas passagens para conferir – deu
tudo certo. O rapaz se afastou para o fundo do ônibus. Quando descemos
na parada final ainda fiz um gesto de aproximação. Ele me olhou como se
nunca me tivesse visto, voltou-se e começou a andar na direção contrária carregando o pacote com as bolas de plástico.
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