domingo, 16 de dezembro de 2012

Santo André da Bahia: onde ficar onde comer (dicas do Ricardo Freire)

Acabei de voltar da praia de Santo André da Bahia, um lugarejo bonito onde vivi durante anos. Aqui neste blog continuo a guardar as matérias que aparecem nos jornais e nos blogs sobre o lugar. O escrito abaixo é do jornalista e doutor em viajaria Ricardo Freire: o dono do blog "Viaje na Viagem". Saiu em 9.12.2012
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"É a sua praia: se você quer sossego e comida boa
Não é sua praia: se você se incomoda com um mar que nem sempre estará superazul
Vai por mim: A balsa do rio João de Tiba deixa para trás a micareta permanente de Porto Seguro e entra em território de paz. Santo André é um oásis de sossego na Costa do Descobrimento: mesmo no Réveillon e até no Carnaval o lugar permanece a salvo do excesso de lotação. A praia é comprida e deserta: eventuais gatos pingados na areia indicam a localização das pousadas e do hotel. Um defeito? O mar só fica realmente azul na maré baixa, quando não está misturado às águas do rio.
Pousada Victor Hugo - EM FRENTE ao mar
 A maior qualidade? A perfeita integração entre nativos e forasteiros que se instalaram por ali – é isso que faz de Santo André um lugar tão especial. 
Alunos do IASA (foto de Cláudia Schembri)
Pegue praia no beach lounge Casapraia (excelente escolha também para almoçar), no bar de praia da Pousada Victor Hugo ou na barraca da excelente cozinheira Maria Nilza, em Guaiú (10 km). 
A vila tem excelentes restaurantes, como o inventivo El Floridita, na pousada Corsário, e o Gaivota, ambos debruçados no rio; o vero italiano Sant’Ana, na ruazinha beira-rio; os restaurantes das pousadas Jacumã e Vila Araticum, abertos ao público; e a Chácara do Céu, dos antigos donos da Casapraia, que realizam jantares especiais mediante reserva com antecedência. Às sextas-feiras há sessões de cinema na Casapraia. Às noites os locais costumam se encontrar no Sant’Ana, no Bar do Rio ou no shoppingzinho a céu aberto da vila. A região é própria para pesca oceânica (marlim azul) e para mergulho (nos corais do Araripe). O passeio mais bacana é ir a Belmonte (30 km), que tem um casario histórico (não tão bem conservado quanto o de Canavieiras) e lá pegar um barco para percorrer os canais do rio Pardo, no delta do Jequitinhonha.
Onde ficar: pé na areia você pode escolher entre duas ótimas pousadas, a clássica Victor Hugo e a caprichada Jacumã. A Casapraia tem um bangalô de arquitetura excepcional (mas leve em conta que fica perto do restaurante). A praia também tem um resort sui generis, o Costa Brasilis, que mais parece uma pousada espalhada em um grande terreno (entenda isso um elogio). Outras duas pousadas não ficam exatamente na areia, mas estão na praia: a Vila Araticum, na “quadra de trás”, e o bed & breakfast Banana da Terra, nos fundos da pousada Victor Hugo.
Na vila, à beira-rio, estão a pousada Corsário, a Ponta de Santo André e a Gaili.
Pousada Ponta de Santo André

10 km ao norte da vila encontra-se o hotel mais exclusivo da região, a Toca do Marlin, de apenas 10 apartamentos, enormes, construídos com materiais de luxo, e com um haras anexo.
Próxima à praia de Guaiú, a Canto da Reg costuma ter bons preços; é bom estar de carro se quiser curtir a vila.
Como chegar: saindo de Porto Seguro pela orla norte, em 30 km você chega a Santa Cruz Cabrália, onde pega a balsa que leva 10 minutos para atravessar o rio João de Tiba. A vila de Santo André fica 3 km adiante. Do centrinho é possível entrar na praia e seguir caminhando pela areia; mas é melhor chegar à areia pelas pousadas e restaurantes.'
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sábado, 8 de dezembro de 2012

profissão diplomata: uma crônica de Sonia Bonzi

Quando abri a caixa de entrada hoje achei um presente de Sonia Bonzi, uma amiga que atualmente reside em Túnis. Esposa de diplomata (um embaixador) ela de vez em quando nos brinda com um relato sobre a movimentada trajetória de quem já morou em cada esquina do mundo. Desta feita, são memórias vívidas dos anos passados em Viena.
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Viena, a capital musical da Europa (foto internet)
"Muitas vezes, para matar as horas, sento-me nos bancos da Catedral de Santo Estevão, medieval, magnífica, cheia de glórias e fuligem dos séculos. Ali passo em revista as imagens dos santos, o que sobrou dos vitrais. Envolvo-me na luz fosca das velas, deixo o som do órgão reverberar em minh’alma e, mesmo sem fé, rezo. Peço sabedoria para enfrentar os desafios da nova vida. 
Caminho pelas ruas, admiro a graça das fontes, o romântico das ruelas, o charme dos prédios, a limpeza das ruas, a educação dos motoristas, a obediência dos pedestres...
Incontáveis vezes me sento sozinha no Café Demel, no Kohlmarkt. Tomo um espresso cheiroso e denso, como a famosa “Sachertorte” ou uma “Apfelstrudel”. A beleza do ambiente, o doce da torta, tornam mais suportável o azedume das garçonetes mal humoradas - velhas e gordas.
Roy Lichtenstein
Outro dia, ao voltar da aula de alemão, assisti a uma cena traumática, que me fez perder o desejo de sair de casa, de apreciar as belezas da cidade. O bonde estava cheio. Um casal de iugoslavos discutia em servo-croata. Falavam em voz alta. Parecia briga de marido e mulher. Depois de alguns minutos, o homem, muito irritado, fez estalar um tapa no rosto da companheira. Os passageiros, já incomodados com a discussão, começaram a aplaudir, entusiasticamente. Quando o bonde parou, o casal desceu desconcertado. Desci atrás deles, apesar de estar ainda longe do meu prédio. Caminhei pelas ruas, atônita. Jamais vira coisa semelhante. A manifestação da massa me foi mais inaceitável do que a reação do homem, e eu tive medo de continuar a dividir o mesmo espaço com aquelas pessoas, as mesmas que no final de concertos magníficos só eram capazes de uma ovação contida.
Caminhei umas seis quadras e baixinho cantei:

“Eu quero ir minha gente,

  Eu não sou daqui

  Eu não tenho nada...”

Chegar em casa foi um prazer. Tirei os sapatos, joguei os livros sobre a mesa e deixei meu corpo tombar sobre a grande espuma, que servia de sofá na sala. A cena do bonde me torturava. Um misto de medo e ódio era o que eu sentia. 
O povo que ovacionou Hitler ainda ofende os trabalhadores braçais vindos dos países do Sul da Europa, em especial, da Iugoslávia. Chamam-lhes “iuques”, com desprezo e desrespeito. Meu marido, com seus cabelos negros, se usa terno e gravata, é bem tratado. Vestido com jeans e camiseta é olhado com suspeita. Pode ser um iugoslavo, um italiano do sul, um grego... 
A brancura de minha pele, que sempre me incomodou, é, em Viena, um escudo. Por ela não sou muito discriminada. Um nobre, de estirpe local, me aconselhou a esconder minha origem mestiça. Disse que eu podia passar por europeia. Logo eu, que me orgulho tanto desta mescla de preto-índio-português-espanhol-italiano-judeu...
os Fachinis e amigos no deserto da Tunísia (foto de Sonia Bonzi)
Ao pôr os pés fora da porta do apartamento sinto medo. Fico esperando por alguma repreensão e me preparo para brigar. 
Em minhas saídas descobri, com surpresa, curiosidades da cultura local. Fazem compras para as necessidades de cada dia: um bife pequeno, uma batata, um tomate... Nada de estocar, comprar para a semana, para o mês... 
Os velhos moram e morrem sozinhos. Os filhos, com muita antecedência, pedem permissão para fazer uma visita no dia de Natal. Muitos restaurantes não aceitam crianças, mas têm vasilhinhas de aço inox para os cães bem educados, que vêm com seus donos. Há um horror a crianças. Mulheres grávidas quase não se vêem. Muitos prédios não alugam apartamentos para casais com filhos.
 David Hockney

Voltando um dia para casa, cheia de sacolas, sentei-me no bonde. Na parada seguinte entrou uma senhora com uma bengala na mão. Começo a juntar minhas compras para ceder-lhe o lugar. Antes que eu tivesse tempo de me levantar, levei uma bengalada na canela e ouvi um grunhido acusatório. Perdi o juízo. Depositei meus pertences no chão e, atrevidamente, disse para a velha senhora que eu não ia mais lhe dar meu lugar, que ela deveria já ter morrido há muito tempo, que fosse para o inferno. 
Outra vez desci antes do ponto. Meu desejo era o de tomar a bengala da anciã e dar-lhe boas cacetadas. 
Tanta agressividade dentro de mim me faz mal. Optei por hibernar. Ser filha única me ensinou a estar só. 
... “Eu não sou daqui”...
Viena pouco corresponde às minhas fantasias. Muito mais sapo do que príncipe. Em vez de Sissi e Franz Josef encontro nobres trabalhando. Uma princesa vende sapatos e bolsas em uma lojinha no Lugeck. A realeza falida vai aos coquetéis nas embaixadas para comer e beber de graça. Um conde me contou que vive em apartamento pequeno por não ter como manter seu castelo. Tudo tão decadente!...
As noites terminam às dez, no máximo, às onze horas. Um programa é ir ao parque de diversões Prater. Música animada, muita cerveja, vinho quente e alguma vida. As pessoas comem pipoca, algodão doce, maçã do amor, castanhas... Turistas e imigrantes são maioria. Há mais descontração.  Uma imensa roda-gigante tem vagões de bonde em vez de cadeiras. Dela vê-se quase toda a cidade, o brilho das torres douradas, os contornos do rio e das montanhas. 
Eu gosto dos cenários. 
Minhas dificuldades são com o elenco e a platéia."
Viena, 1974
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outra crônica de Sonia Bonzi pode ser encontrada aqui

sábado, 24 de novembro de 2012

navegar é preciso

Um amigo me mostrou esta coletânea de crônicas da jornalista Lívia Nunes. Foram publicadas no jornal em que ela trabalha, em Taquaritinga (SP) - obrigada aos dois pelo presente!
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tela de Georg Schrimpf

– Relaxe, mãe. Essa é frase que mais tenho dito nos últimos tempos, no melhor estilo "faça o que eu digo, não faça o que eu faço".
Integrante de uma geração que vivenciou – mas não viveu – a liberalização sexual, as viagens lisérgicas e tantas outras revoluções que seguem transformando o mundo, a Diva faz o impossível para quebrar a resistência diante de tantos assuntos – mas uma hora a estrutura balança. Namoro de muitos, muitos anos, filhos só depois de casada, tudo nos conformes de então, hoje ela se vê, ao lado do Flávio, na ponta de uma família com crianças fora do casamento, filhos casados não oficialmente e não casados com filhos. A maioria dentro de sua casa. Passa noites em claro velando o sono de netos febris, num momento da vida em que deveria apenas curtir a parte boa de ser avó.
XXX
C’est la vie. E ela ama. Mas anda tendo muita dor de cabeça, preocupação dobrada e a sensação de que está perdendo o controle da situação. Aí é que entro com meus ensinamentos de autoajuda, talvez para aliviar a culpa: ninguém tem o controle de nada, mãe. Ninguém controla o leme da vida. Da própria e de nenhuma outra. Temos a ilusão – e é só mesmo uma ilusão – de que somos responsáveis por nossos caminhos, de que podemos programar nosso destino. Não podemos. A gente até toma decisões, mas essas escolhas são ínfimas se olharmos o todo. Somos pó. E ao pó voltaremos. A "Bíblia" diz isso, não é?
XXX
Vou crescer, me casar, ser promotora de Justiça que nem meu pai e morar em casas conjugadas com as das minhas melhores amigas, a Mônica e Ana Lúcia. Esses eram meus planos quando eu tinha 5 anos de idade. Eles mudaram muito no decorrer do tempo, e nenhum deles, nenhum, se concretizou. 
ilustração Daniel Kondo
 Porque, no meio do caminho, você descobre que aquele emprego tão almejado traz mais angústias que realizações; porque alguém vai embora; porque um coração para. Porque uma onda gigante e silenciosa passa tragando tudo e todos pelo caminho, nas férias paradisíacas dos gringos ricos nos países de terceiro mundo.
XXX
É praticamente impossível estarmos vivos. Sob qualquer ótica, religiosa ou científica. Contraria a lógica. Se foi Deus quem escolheu nos criar, a sua imagem e semelhança, e nos tornar os únicos – que improvável! – seres deste tipo no universo conhecido, thank you, God! Por outro lado, se, num golpe de sorte, o nada explodiu e cá estamos nós, gás e poeira cósmica, pensando, amando, construindo uma história, é nossa obrigação retribuir. 

Vivendo. Não transformando coisas ínfimas em problemas. Não desqualificando o outro porque não conseguimos lidar com nossa própria insignificância. Sem muitos dramas. Porque eu digo, e repito, e repito: é curta e boa, essa vida. Há sofrimento; então, que não soframos por antecipação. O bom é aproveitar ao máximo esse intervalo rumo ao desconhecido.

sábado, 17 de novembro de 2012

a polêmica construção de BELO MONTE



A construção da hidroelétrica de Belo Monte tem gerado discussão, paixão e polêmica – geralmente condenatórias à obra. Para contrabalançar, deixo aqui um artigo em DEFESA de Belo Monte, escrito por Caio Botelho, uma liderança no movimento estudantil universitário no estado da Bahia. É autor do blog Soletrando a Liberdade
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Ao longo de cinco séculos as riquezas deste país vêm sendo saqueadas com pouco benefício para o povo brasileiro. O maior inimigo da natureza é a desenfreada sanha dos capitalistas de plantão pelo lucro, prontos para destruir tudo o que vêm pela frente, sem nenhum critério ou controle.
"Lavadeiras do rio Piabanha" tela de Carlos Gomes
Por outro lado, existem os que defendem que os recursos naturais devem permanecer intocáveis, e que qualquer ação humana deve ser interpretada como uma grave agressão ao futuro da humanidade. Em regra, os defensores desse ponto de vista são pessoas de classe média e moradores das grandes cidades. Parecem ignorar o fato de que, em regiões como a floresta Amazônica, vivem milhões de brasileiros que têm tanto direito à saúde, educação, moradia e vida decente quanto eles.
É muito fácil, por exemplo, criticar a construção de uma estrada quando não somos nós que temos que passar dias e noites em um barco para chegar a um hospital.  É simples se opor à construção de uma usina hidroelétrica quando temos energia em casa para assistir confortavelmente a um jogo de futebol ou aos últimos capítulos da novela.
Os dois posicionamentos não levam em conta a necessidade de desenvolver o país e a melhoria da vida do povo. Desconsideram o fato de que é possível explorar de forma responsável a natureza, evitando a sua destruição.
E é nessa seara que se encontra a polêmica sobre a construção da usina hidroelétrica de Belo Monte, no estado do Pará, que será a terceira maior do mundo, atrás apenas de Três Gargantas e Itaipu. Pronta, terá a capacidade de produzir em torno de 10% da demanda nacional de energia elétrica.
Três Gargantas - China
Existe uma verdadeira campanha de desinformação contra a construção de Belo Monte, baseada em frases ocas (embora bonitas) e em informações falsas. Os atacantes se valem muito mais do apelo emocional do que de dados concretos.
Até um vídeo com atores do elenco global foi produzido e difundido nas redes sociais.  Os pobres coitados, na ânsia de se apresentarem ao grande público como “politicamente corretos”, apressaram-se em ler um roteiro pronto sem se dar conta da coleção de mentiras que falavam.
Mas o pior é que muita gente acaba caindo nesse conto do vigário e defendendo algo que não conhece a fundo. Por pura ingenuidade. Basta pesquisar sobre Belo Monte para termos acesso a um conjunto de informações que desmentem os “profetas do apocalipse”.
É mentira, por exemplo, o fato de que as comunidades indígenas teriam suas aldeias alagadas ou que a construção da Usina traria prejuízos ao Parque Nacional do Xingu.
No caso dos indígenas, nenhum – repito, nenhum – dos oito grupos étnicos que vivem nas regiões próximas à futura Hidroelétrica (a saber, os kayapós, araras, arareutes, apidereulas, jurunas, maracanãs e munducurus) será obrigado a mudar-se e nem terão suas aldeias inundadas. Alguns, inclusive, são favoráveis à construção da Usina.
E sobre o Parque Nacional do Xingu, um dos nossos maiores patrimônios e que deve ser preservado a todo custo, uma rápida olhada no mapa é  suficiente para perceber quão risível é a alegação de que esse tesouro nacional seria ameaçado por Belo Monte: o Parque fica no estado do Mato Grosso, a mais de 1.300 quilômetros da Usina.
ritual de dança do Kuarup, na reserva do Xingu
Mas porque não investir em outras fontes de energia limpas, mais baratas e eficientes, como a eólica e a solar?
 Porque, além da energia gerada por uma hidroelétrica ser igualmente limpa, essa estória de que energia eólica e solar é mais barato e eficiente não passa de um conto da carochinha. Para produzir a quantidade de energia de Belo Monte seriam necessários investimentos duas vezes maiores em energia eólica, e sete vezes maiores em energia solar. Sem contar que essas fontes energéticas são instáveis e suscetíveis às variações climáticas. Investir em energia eólica ou solar na região amazônica seria tão inteligente quanto temperar o feijão com açúcar. O Norte do Brasil abriga a maior bacia hidrográfica do planeta.
tela de David Hockney - "Totem caído"
Claro que impactos ambientais serão causados pela construção de Belo Monte. Não podemos esquecer que a humanidade, pelo simples ato de existir, já produz transformações na natureza. O que se deve fazer é avaliar se a contrapartida oferecida à sociedade vale a pena.
O fato é que o Brasil, pela primeira vez na história, está conseguindo crescer e distribuir renda ao mesmo tempo. E é claro que esse desenvolvimento e a ascensão social de dezenas de milhões de brasileiros aumentaram radicalmente a demanda energética, que continuará a crescer nos próximos anos.
Sempre é bom lembrar que foi a ausência de investimentos no setor que causou uma grave crise de energia entre 2001 e 2002, responsável pelo desaquecimento da economia, aumento da conta de luz, apagões e prejuízos incalculáveis ao país. Sem Belo Monte, em pouco tempo poderemos novamente nos deparar com uma situação semelhante.
É preciso também desconfiar de personalidades irresponsáveis que tentam se promover à custa de discussões tão caras ao nosso povo. Enquanto Marina Silva discutia o assunto em um debate promovido por FHC em São Paulo, ou enquanto o cineasta James Cameron e a atriz Sigourney Weaver participavam de um ato contra Belo Monte em um hotel cinco estrelas de Manaus, o governo brasileiro fazia mais de 30 audiências públicas com as comunidades afetadas. Fruto dessas discussões, firmou-se o pacto de que quase R$ 4 bilhões serão investidos em ações socioambientais na região.
a atriz Sigourney Weaver, no filme "Avatar"
O discurso fácil ignora a opinião de milhares de moradores que serão deslocados das palafitas onde moram atualmente para casas decentes. E deixa passar, como mero detalhe, os mais de 20 mil empregos diretos e indiretos gerados pela Usina, todos na região, uma das mais que mais sofrem com o desemprego e a pobreza no país.”
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é conveniente lermos opiniões diferenciadas antes de formar uma opinião sobre questões complexas...
(por ser muito longo, o artigo foi ligeiramente sintetizado)

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Frank O'Hara e a morte de Billie Holiday



Frank O'Hara
os poetas de Gana
Frank olha o mostrador do relógio: é meio dia e vinte do dia 17 de julho de 1959 em New York. Naquela época, ele, Frank O’Hara,   era um poeta de prestígio.  Autor de estilo casual, gostava de escrever poesia na hora do almoço   (Lunch Poems é um livro seu – Poemas da hora do almoço). Ia empilhando frases de ações cotidianas – “fiz isto, fiz aquilo outro” – uma após outra. Assim, nos diz que adquiria um leve bronzeado enquanto subia a rua mormacenta, à procura de um engraxate. Ia pegar o trem das 4:19 e desembarcar às 7:15 em East Hampton – um lugar cheio de prováveis ricos esnobes. Melhor chegar lá com os sapatos engraxados. A voz que nos fala no poema pertence a alguém acostumado a encontrar portas abertas – tanto que nem sabe quem serão os anfitriões.  Come um hamburger acompanhado de milk-shake de chocolate.  Compra uma revista literária, a NEW WORLD WRITING, para ler os que os poetas de Gana estão produzindo. Vai ao banco e fica surpreso quando a mulher do caixa desconta o cheque sem checar seu saldo.  Prossegue até uma livraria, quer levar presentes para alguns amigos – provavelmente outros convidados, uma vez que deixou claro desconhecer os donos da casa onde terá a ceia.   Para alguém chamada Patsy ele compra um livro de poemas de Verlaine com gravuras do pintor Bonnard.  Para Mike ele leva  uma garrafa de um sofisticado licor italiano que achou em Park Lane, um endereço caro de New York. Dá a volta e entra na tabacaria. Lá dentro ele vê a fotografia da cantora Billie Holiday na primeira página do jornal –  a notícia da morte dela. O nome de Lady Day não aparece no poema – sabemos que é Billie pela citação do nome do pianista que a acompanhava – Mal Waldron.
tela de Pierre Bonnard - Mulher com papagaio
Começa a suar de tristeza – ou talvez seja o calor. Recorda a última vez que a ouviu cantar -- num clube noturno em voga à época – o 5 Spot.   Ele estava encostado na porta do banheiro embevecido com a voz sussurrante de Billie que cantava ao dedilhado do piano até deixar todo o público sem ar inclusive o poeta e o pianista
(abaixo, o poema propriamente dito, tradução de Ruy de Vasconcellos  (Revista Zunái)

O DIA EM QUE A DAMA MORREU 
É 12:20 em Nova York, uma sexta
três dias depois da queda da Bastilha, sim
é 1959 e ando atrás de um engraxate
porque vou desembarcar do 4:19 em Easthampton
às 7:15 e então vou logo jantar
e não conheço as pessoas que vão me dar de comer 
Caminho pela rua mormacenta abrindo-se ao sol
Peço um hambúguer e um maltado e compro
um horrendo NEW WORLD WRITING  para ver o que
poetas em Ghana estão fazendo esses dias
                                                 e vou ao banco
e a Senhora Stillwagon (primeiro nome Linda, ouvi uma vez)
sequer confere meu saldo pela primeira vez na vida
e no GOLDEN GRIFFIN consigo um Verlaine fino
para Patsy com desenhos de Bonnard, embora tenha
pensado em Hesíodo, trad. Richmond Lattimore, ou
a nova peça de Brendan Behan, ou Le Balcon ou Lê Négres
de Genet, nada disso, insisto no Verlaine
depois de praticamente adormecer de dúvida 
e para Mike só avanço pela loja de destilados da
PARK LANE e peço uma garrafa de Strega e
logo retorno de onde eu viera, 6ª Avenida
para a tabacaria do Teatro Ziegfeld e
distraído peço um maço de Gauloises e um maço
de Picauyunes e um NEW YORK POST com o rosto dela  

e estou suando em bicas agora e pensando em
recostar-me ao pórtico do 5 SPOT
enquanto ela sussurrava uma canção ante o piano
para Mal Waldron e todo mundo e eu parávamos de respirar