segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

O príncipe da FAAP



Wagner Moura, antigo Capitão Nascimento, agora na pele de Hamlet, em atuação inesquecível.

Vale a viagem para São Paulo.

Este Hamlet brasileiro entra e sai do palco durante 3 horas (que a platéia nem sente passar), dizendo as falas de um texto sem pretensões literárias, mas que funciona: a idéia é que o público entenda.

Afinal, todo mundo sabe que há algo de podre no reino da Dinamarca.

Wagner está inspirado, mormente naquela célebre parte da “peça dentro da peça” quando o atormentado príncipe conversa com a trupe que vai encenar “O assassinato de Gonzaga” no castelo. Hamlet é um dos textos de Shakespeare que mais retrata o processo da dramaturgia, como mostra Hamlet, num dos seus monólogos:

Não é monstruoso que esse ator aí,
Por uma fábula, uma paixão fingida,
Possa forçar a alma a sentir o que ele quer,
De tal forma que seu rosto empalidece,
Tem lágrimas nos olhos, angústia no semblante,
A voz trêmula, e toda a sua aparência
Se ajusta ao que ele pretende?
E tudo isso por nada! Por Hécuba!
O que é Hécuba pra ele, ou ele pra Hécuba,
Pra que chore assim por ela.
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Falando em dramaturgia, o excerto abaixo é de um texto de outra atriz, a Fernanda Torres:
O pânico de ser atriz vem da autoconsciência, do julgamento de si mesmo, da expectativa e de qualquer ruído que lembre o quão inútil é a profissão.

Em fevereiro de 1995, pouco depois da estréia da peça Cell Mates, em que fazia um dos papéis principais, o ator inglês Stephen Fry acordou, foi para a garagem, ligou o carro e tentou se matar. Aí pensou na mãe, ficou com pena dela e decidiu fugir. Pegou o carro e, de fininho, foi parar na Alemanha. Passou meses desaparecido. A peça saiu de cartaz. Fry também — segundo o próprio, para sempre. Mas voltou ao cinema, tendo feito o papel-título em Wilde. A razão de largar o teatro? Aquilo que, em inglês, se chama stagefright.

Não existe uma boa tradução de stagefright para o português. “Pânico de palco” deixa a desejar. “Pânico da platéia”, idem. Talvez a melhor tradução seja “pânico de cena”, ou “medo da cena”. Afinal, não é propriamente do palco que o ator tem pavor, nem da platéia. É do todo: pavor de perder o próprio sentido da profissão. Qualquer ator se pergunta antes de entrar em cena: “Mas, afinal, por que fui inventar isso pra mim? Por que não sou engenheiro ou médico? Que sentido há em fingir que sou outro?”.

Pânico de cena seria um estado patológico no qual o ator, em bom português, trava com as quatro patas, empaca, amarela. No estrangeiro, os casos são inúmeros, graves e renomados. Laurence Olivier se livrava da pressão de ter que ser Olivier xingando o público na coxia, antes de começar o espetáculo. Depois que passou dos sessenta, o pavor era tamanho que ele pensou em desistir da profissão. (...)

Wagner Moura me disse que, no Carandiru, os atores gostavam de pegar sol no pátio do presídio durante os intervalos das filmagens. O problema é que a outra ala da carceragem ainda estava ativada e os presos ficavam pendurados nas grades da cela, olhando os atores e gritando: “Tu é marginal porra nenhuma! Tu é viado! ô, viado!”. Ninguém do elenco quis mais arejar lá fora, para não ter que lidar com a crítica feroz dos presos. Esse negócio de fazer gente que existe é uma coisa muito complicada.”

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