quinta-feira, 11 de setembro de 2008

A batalha de Argel




Ontem à noite nossa pequena confraria cinéfila se reuniu para assistir A batalha de Argel, de Gillo Pontecorvo.

Finalmente colocamos em prática a idéia de (re)ver clássicos do cinema de ficção e documentários de temática política. Oba!

Com o sono “atrasado” comecei a ver o filme desanimada, mas logo fui sacudida pela beleza das tomadas em preto-e-branco do bairro europeu e da Casbah (bairro popular) de Argel. É um quase-documentário emocionante que nos mantém em suspense do início ao final. Retrata a luta do povo argelino pelo fim do colonialismo francês e, em particular, o despertar da consciência política de Ali La Pointe (figura histórica real) que convive com prisioneiros políticos na cadeia e assiste à execução na guilhotina de vários companheiros. Ao ser libertado, Ali procura a Frente de Libertação Nacional (FLN) e engaja-se na luta pela independência.

Na escalada da violência, atentados terroristas provocados pelos dois lados, provocam a intervenção do Exército francês (pied-noirs) e a chegada do coronel Mathieu, personagem inspirado em Jacques Massu, o carrasco de Argel, adepto de torturas e execuções sumárias. Há poucos anos o The New York Times noticiou que o filme foi exibido no Pentágono para militares norte-americanos inconformados com a resistência teimosa do povo iraquiano.

Um dos aspectos que mais gostei foi perceber que Pontecorvo condena as ações terroristas, destacando os inocentes como as maiores vítimas. A música (Enio Morricone) é a mesma após os atentados praticados por franceses e argelinos, praticamente um réquiem. Ao contrário do cinema norte-americano, que em geral demoniza o inimigo e não lhe dá voz, A Batalha de Argel expõe os pontos de vista e os métodos aplicados por argelinos e franceses. Mesmo assim, é inegável a empatia do espectador para com os colonizados.

A batalha de Argel foi vencida pelos franceses, mas os argelinos ganharam a guerra. Hoje a revolução proletária é uma relíquia do século XX, porém a dominação estrangeira, as ambições imperialistas e as reações nacionalistas prosseguem pelo século XXI adentro. Basta ver – entre outros – Kosovo, Iraque, Afeganistão, Ossétia do Sul...

A batalha de Argel ganhou o Leão de Ouro no Festival de Veneza em 1966. Ficou banido na França até 1971. No Brasil só foi exibido após a abertura política, no início dos anos 80. Após assisti-lo, Marlon Brando quis filmar sob a direção de Pontecorvo, nascendo assim outro clássico Queimada (1969) sobre a dominação colonial nas Caraíbas.
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Obs.: lembro de alguém comentando como as ruelas da Casbah pareciam as de uma favela carioca. Alguns concordaram, outros não. O excerto abaixo retirado do blog de um carioca, alinha-se com os primeiros:

“Outro aspecto atual é uma comparação entre A Batalha de Argel e Tropa de Elite. A geografia de Argel guarda semelhanças com a Zona Sul do Rio de Janeiro: Botafogo, Copacabana, Ipanema e Leblon estão bem próximos das favelas penduradas nos morros.

Quem assiste A Batalha de Argel facilmente pode imaginar o coronel Mathieu comandando uma invasão em alguma favela carioca. Se a questão for reduzida a uma disputa pelo domínio territorial, pondo-se de lado os objetivos dos grupos em ação, o capitão Nascimento certamente adoraria ter a colaboração do coronel Mathieu. Se a operação conjunta fosse bem sucedida, poderiam até inspirar o tema de uma escola de samba para o carnaval seguinte, algo como “O Molho Francês na Batalha de Dona Marta”, com o samba-enredo tendo por refrão “Mathieu, Mathieu, agora nos morros mandamos você e eu”.

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