terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

A casa das 7 mulheres ou o Ocaso das 7 musas

(Fernande, esquerda)


Foram sete as mulheres que fizeram a cabeça de Picasso, um homem de paixões intensas e talento inatural, que teve a vida marcada pela genialidade e pelo fascínio pelas mulheres. Como se sabe, nos quadros do amor o pintor foi um caso à parte, um tipo de superstar da época, disputadíssimo pelas damas e outras senhoras, o que vamos e venhamos era uma maravilha para seu decantado priaprismo.
(retrato de Olga, à direita, em cores)

Do signo de escorpião -- um animal tão intenso no abraço quanto na ferroada – Picasso foi um amante insensível e despreocupado com os sentimentos das mulheres, mesmo vivendo uma relação intensa ao se apaixonar por outra descartava a antiga sem pestanejar. Dora Maar repetia que Picasso utilizava a mesma técnica de conquista, dizendo coisas como “Sabe que antes de você nascer eu já havia pintado seu rosto? ou “Quando você anda pelas ruas não lhe dizem que parece um quadro de Picasso?”
Fernande Olivier, a primeira musa (1904 a 1912)
Viveu com ele durante os anos de pobreza e boemia. No livro “Na cama com Picasso” ela é descrita como “alta, bonita, cabelos ruivos e fartos, olhos verdes amendoados e um corpo que lembrava o das esculturas gregas. Nádegas belíssimas, era a própria Vênus calipígia. Vestia-se com elegância, portava-se como uma senhora, expressava-se em um francês refinado.”
Fernande era uma modelo exuberante, tinha 26 anos e costumava posar nua – conheceu Picasso em seu atelier, o Bateau-Lavoir, uma antiga fábrica desativada. Passaram a viver juntos no outono de 1905 até 1912 ano em que ela tomou a decisão de deixá-lo porque ele já se mostrava ausente na relação. Ela nunca se recuperou da separação. Morreu solitária e na miséria, em 1956. Fernande foi a amante que influenciou a passagem da fase azul, período em que a melancolia e a morte tingem os trabalhos do artista, para a fase rosa. Foi ela que lhe proporciounou estabilidade para experimentar novas cores e novos temas.
A vez de Eva (1911 a 1915)
Conheceram-se no circo Médrano, em Paris, em torno de 1910. Eva era delicada, introvertida e casada com um pintor polonês, a quem logo abandonou para viver com o pintor espanhol, sem vínculos legais.Nunca posou para ele, mas há inscrições em alguns quadros cubistas de frases como “J’aime Éva” e “Pablo/Eva” . A coitada morreu de câncer e tuberculose quando ainda morava com Picasso deixando-o arrasado.
A próxima foi Olga Koklova (1917 a 1935)
Nascida na Ucrânia, Olga era uma mulher ruiva de olhos verdes, muitas sardas e bastante ciúme. O pintor a conheceu durante uma passagem por Roma da companhia de balé russa de Sergei Diaghilev -- ela fazia parte do elenco de bailarinas. Casaram-se numa igreja ortodoxa em Paris e não viveram felizes para sempre, a relação foi repleta de brigas violentas. Tiveram um filho em 1921 (Pablo filho trabalhava como motorista do pai).
Fútil e ambiciosa, Olga incentivou-o a freqüentar a alta sociedade parisiense. Com esta moça, filha de um coronel hussardo, o artista retomou a figuração e mergulhou no “discreto charme da burguesia” vindo a pintar retratos da aristocracia européia. Ela morreu de câncer em 1955, em um hospital de Cannes.
A quarta casa: Marie-Thérèse Walter (1927 a 1943)
Picasso conheceu essa linda garota de 17 anos, uma moça alta e loura descendente de suecos, em frente as Galerias Lafayette, uma das mais famosas lojas de departamentos parisienses. Tornaram-se amantes, embora nunca tenham vivido juntos, ele a visitava semanalmente. Dessa relação clandestina nasceu Maria de La Concepcion, apelidada de Maya. Marcou uma fase lírica, surrealista e sensual na obra de Picasso – no auge da relação ele arredondou e suavizou os traços das mulheres que pintava. Embora o relacionamento deles tenha sobrevivido por 7 anos, após um breve entusiasmo inicial Marie-Thérèse se transformou numa sombra vaga. Enforcou-se em 1977, quatro anos após a morte de Picasso.
A quinta chamava-se Dora (1936 a 1944)
Morena de olhos azuis-claros e grossas sobrancelhas, seu nome verdadeiro era Henriette Theodora Markovitch. Chegou a viver um tempo na Argentina, com o pai, de nacionalidade iugoslava. Tinha brilho próprio como fotógrafa e figura mundana – era a musa dos surrealistas, amante do escritor Georges Bataille e amiga dos poetas Paul Éluard e André Breton – quando Picasso a avistou pela primeira vez numa noitada do Café Deux Magots em Paris.
Era uma noite de outono, ela estava sentada numa mesa a sua frente. Usava luvas pretas com bordados de rosas e se ocupava em cravar um pequeno canivete na madeira entre os seus dedos espalmados na mesa. Às vezes errava o alvo e aos poucos a luva foi se manchando de sangue. Picasso comentou com um amigo que a achava extraordinariamente bela. Mais tarde Picasso lhe pediu estas luvas e guardou-as numa vitrine junto com outros objetos.
Dora Maar se tornou uma amante alucinadamente apaixonada. Todos os dias esperava um sinal de Picasso em seu apartamento, sem aceitar outros convites, pois ele poderia telefonar convidando-a para sair. Os dois brigavam muito: Picasso gostava de acusá-la de infiel, insultava-a e zombava dela até levá-la ao pranto quando então calmamente puxava seus cadernos de notas e fazia esboços dela chorando. Nesta época ele ainda estava casado com Olga e continuava seu romance com Marie-Thérèse. A maioria dos retratos de Dora Maar mostra uma face distorcida, machucada, pintada em cores desarmônicas e tristes.
“São todas faces de Picasso, nenhuma é Dora Maar”, ela dizia. Um dos mais memoráveis retratos do artista é sem dúvida, o seu “Mulher chorando”, pleno de cores que desnorteiam o olhar: verde, vermelho, violeta, amarelo, azul... O lenço branco amarrotado se mistura com as lágrimas. O chapéu alegre dá a impressão que a mulher se fez bela numa expectativa de felicidade e agora está ali, exposta à visão de todo mundo, uma face em chamas e despedaçada pela emoção. É o rosto que aparece em Guernica, aquele da mulher que segura o filho morto, numa convulsão de dor. A face da mulher em pranto sem lágrima é a de Dora Maar.
Das mulheres do artista foi a que mais sofreu com a separação. Viveu sozinha em sanatórios e conventos até sua morte aos 90 anos.
A sexta foi Françoise Gilot (1943-1953)
Ela mesma uma pintora produtiva e talentosa, conseguiu manter uma relação familiar com Picasso durante dez anos. Tiveram dois filhos, Claude e Paloma. Tiveram um convívio sufocante – não deve ser nada fácil casar com um gênio. Em suas memórias, diz que foi manipulada e traída pelo marido.
A última: Jacqueline (1952 a 1973)
Picasso e Jacqueline Roque – uma mulher bonita de cabelos negros, olhos azuis e traços fortes – casaram-se secretamente e viveram juntos até a morte dele. Neste período, o artista trabalhou intensamente, inclusive sobre obras de Velasquez e Delacroix. Musa dos últimos anos, secretária e agente, foi retratada de forma obsessiva – nada menos que 163 quadros foram dedicados a ela.Jacqueline venerava o marido, ele era seu Deus e seu Sol. Não suportou a perda, em depressão profunda se suicidou com um tiro na cabeça em 1986.

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