domingo, 19 de abril de 2009

A noiva cadáver


A noiva surgiu na telona na noite de quarta-feira passada, com esse mesmo figurino da foto. No filme de animação do Tim Burton que o Cine Cajueiro apresentava nesta noite para a criançada da Vila de Santo André, a noiva cadáver estava numa enrascada: queria casar com um rapaz do mundo dos vivos, enquanto ela, pobrezinha, já habitava no mundo das sombras.


Mesmo sob a forma de esqueleto, a moça estava graciosa, olhos enormes e expressivos, boquita vermelha e um figurino de sílfide. A magreza franciscana não chegava a assustar, acostumados que estamos aos tipos anoréxicos. De vez em quando caía um pedaço de braço ou uma mão, no chão. Ela se inclinava graciosamente e atarraxava a peça de volta no lugar, com um leve clangor.


O cinema estava lotado, ou seja, todas as cadeiras foram levadas para a rua e ocupadas, forçando a alguns espectadores o exercício de ver o filme em pé, como tem sido comum, nos últimos meses. Por sorte, uma amiga, dona da Pousada Gaili passou a caminho da pizzaria Estrela. Vendo o pessoal em pé, ofereceu, graciosamente, mais cadeiras para o Cine Cajueiro.


Ôba!


Essa vivência de cinema na rua que estamos promovendo aqui, há mais de dois anos, toda semana – exceto quando chove ou estamos fora do povoado – me faz lembrar do relato de uma amiga de Brasília. Ela contava que, quando criança, o pai (militar) era, às vezes, removido para os rincões do País, e numa dessas longíquas localidades havia uma única sessão de cinema, nas tardes de domingo. O cine era uma espécie de salão paroquial, vazio, de maneira que cada espectador precisava levar sua própria cadeira, gerando uma parafernália de assentos das mais diferentes alturas, larguras e comprimentos.


Mas voltando à noite da noiva cadáver: quando já estávamos nos aproximando do final, percebi que dois ou três meninos saíram correndo em direção à Cabana Nativa, um bar-dançante próximo. Segundos depois, uma meia-dúzia voou para lá. À esta altura o zunzunzum se espalhara: “é briga”!


Aí foi o tropel... Sobraram poucos, no cinema. Ainda ouvi um adolescente filosofar: “a humanidade é movida à curiosidade.” Foi uma briga entre 2 homens nativos, onde um deu uma paulada de paraju (madeira também conhecida por maçaranduba) na cabeça do outro, abrindo um rombo superficial, suponho, pois no dia seguinte o moço voltou do hospital, para onde foi levado às pressas pelos conhecidos.


Poucos minutos depois, voltaram correndo para assistir o final do filme e “pegar as melhores cadeiras”.


Só quem não voltou foi L., a criança que assistia – feliz – o filme ao meu lado... o homem agredido é o pai dela. Tristeza.

Um comentário:

m.Jo. disse...

Esse cine cajueiro é uma iniciativa sensacional. Parabéns, Olímpia. Comida, diversão e arte.