Diagonal de degraus, Ródtchenko. Abaixo, Maiakóvski (" Desatarei a fantasia em cauda de pavão num ciclo de matizes...)" |
as irmãs Papin |
Mas voltando ao quadro da entrada – seu título é “As criadas” e diz respeito a um notório caso de assassinato ocorrido na cidade francesa de Le Mans, na década de 1930. O caso das irmãs Papin teve grande repercussão na França. Foi até o tema da tese de doutorado de Lacan (“Da psicose paranóica em suas relações com a personalidade”)! Além de ter sido objeto de cinema (“Entre elas”) e de várias outras obras de arte, como esse quadro de Paula Rego.
Eram três irmãs. Abandonadas pelo pai e vítimas de descaso materno, as meninas tiveram infância dolorosa. Uma foi para o convento; as outras trabalhavam no serviço doméstico de residências burguesas. Durante 7 anos trabalharam como criadas na mansão de um rico advogado, sua mulher e filha. Christine e Léa eram consideradas empregadas-modelo e de tal modo se tornaram imprescindíveis que seu comportamento bizarro era aceito pelo senhorio. Não havia qualquer tipo de comunicação entre os rígidos patrões e a as moças, somente ordens que eram obedecidas em silêncio. Nas folgas, as irmãs se recolhiam ao quarto que dividiam, partilhando a mesma cama. Trocavam delicadezas femininas entre si, camisolas de renda, bordados. O advogado ficava bastante tempo fora de casa. A tensão se acumulava entre os dois pares femininos. O comportamento psicótico das criadas é desatrelado após um incidente banal com a eletricidade da casa (um curto-circuito). Léa passa uma peça de cetim da senhorita e a blusa é queimada.
" A filha do polícia" |
O que houve depois? Transcrevo as palavras do famoso psicanalista e psiquiatra argentino Juan David Nasio, em seu livro “Os grandes casos da Psicose”, de 2001:
"Quinta-feira, 2 de fevereiro de 1933, na cidade de Le Mans, província de Sarthe. São cerca de vinte horas; a polícia municipal é chamada à residência de René Lancelin, que não havia conseguido entrar em sua casa, arromba a casa do antigo procurador e, no primeiro andar, encontra a Sra. Lancelin e sua filha assassinadas, com os corpos pavorosamente mutilados e os olhos arrancados das órbitas.
No segundo andar, refugiadas num canto da cama e agarradas uma à outra, as duas empregadas exemplares, Christine e Léa Papin, confessam sem dificuldade haver cometido o duplo assassinato de suas patroas - patroas irrepreensíveis, segundo suas palavras. Um simples incidente insignificante, a propósito um ferro de passar com defeito e de um fusível queimado, parecia haver desencadeado a carnificina sangrenta".
"Quinta-feira, 2 de fevereiro de 1933, na cidade de Le Mans, província de Sarthe. São cerca de vinte horas; a polícia municipal é chamada à residência de René Lancelin, que não havia conseguido entrar em sua casa, arromba a casa do antigo procurador e, no primeiro andar, encontra a Sra. Lancelin e sua filha assassinadas, com os corpos pavorosamente mutilados e os olhos arrancados das órbitas.
No segundo andar, refugiadas num canto da cama e agarradas uma à outra, as duas empregadas exemplares, Christine e Léa Papin, confessam sem dificuldade haver cometido o duplo assassinato de suas patroas - patroas irrepreensíveis, segundo suas palavras. Um simples incidente insignificante, a propósito um ferro de passar com defeito e de um fusível queimado, parecia haver desencadeado a carnificina sangrenta".
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Ao término da mostra – são 110 obras que traçam uma narrativa visual da condição humana -- abri a porta de saída e procurei imediatamente uma cadeira para sentar...
O que é mais perturbador, a vida ou a arte?
O que é mais perturbador, a vida ou a arte?
2 comentários:
Incrível, não, Olímpia. Fui à Pinacoteca para ver a geometria, as diagonais, os grandes planos de Ródtchenko. Mas... também me deparei com Paula Rego e sua pintura arrancada à fórceps da vida - ou do sonho. Surreal e real. Adorei.
Adorei sua definição da obra da portuguesa... "arrancada à fórceps da vida ou do sonho."
Nunca mais vou olhar para a Branca de Neve do mesmo jeito que antes
bjs
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