segunda-feira, 23 de março de 2009

Filmes - Em tempos de Oscar



Nesta temporada de óscares, os filmes que mais gostei de ver enquanto estava em São Paulo, foram dois filmes europeus, um deles passado em Dourados, Mato Grosso do Sul.

Achei brilhante, a técnica fílmica do diretor francês Laurent Cantet na película que arrebatou a Palma de Ouro (Cannes/2008). Entre os muros da escola tem ares de ficção com traços de documentário, e estilo de reality show, alternadamente. O diretor centrou o roteiro na dificuldade de o homem contemporâneo manter sua identidade num mundo miscigenado, multicultural e em acelerada transformação.

Cantet, como todo bom cineasta, sabe que o maior valor do cinema está nos olhares e gestos sutis que só a câmera pode captar – e não no espetáculo. A personagem principal é um professor, vivido por François Begaudeau, um ex-professor e autor do livro que deu origem ao longa-metragem. Os alunos são alunos reais das escolas da periferia da capital francesa. Cantet consegue tirar deles, enquanto atores, todos aqueles tiques de representação. Pisa em trilhas documentais, mas é através da ficção que ele consegue apresentar as contradições desse universo.

Os alunos, quase todos descendentes de imigrantes, alguns ilegais, são o rosto de uma Europa que não quer se olhar no espelho. É um filme social sem resvalar no discurso rasteiro, uma obra marcante, crítica e dura, mas também engraçada e cativante.

Deixa os oscarizados no chinelo.
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Outro filme que me impressionou nesta temporada foi o italiano “Terra Vermelha” (“La Terra Degli Uomini Rossi”), produzido e dirigido pelo cineasta Marco Bechis, de origem italiano-chilena mas com grande vivência no Brasil.

A fita brilhou no Festival de Veneza (2008) apresentando a luta dos índios da etnia Guarani-Kaiowá, de Dourados, Mato Grosso do Sul, cuja terra está sendo destinada à produção de bio-combustível para carros. Mostra a breve história de amor entre um jovem guarani que está sendo treinado pelo avô para ser xamã e a filha de um latifundiário, contra um panorama de invasões de terra, suicídios e rebeliões.

O filme contou ainda com a participação de cerca de 200 índios Guarani e foi feito em Dourado, a cidade que é o epicentro do drama indígena. Uma das cenas mais chocantes é aquela em que os atores Guarani simulam a invasão de uma fazenda a partir de acampamentos na beira da estrada e a contra-ofensiva dos fazendeiros.

“Terra Vermelha” mostra a devastação causada pelo alcoolismo e pela depressão naquela comunidade indígena, onde desde 1985, vem ocorrendo um grande número de suícidios entre os jovens, frustrados por viverem em reservas, sem conseguir alimentos para suas famílias e confusos no mundo diferente que os cerca.

“Os suicídios acontecem porque não existe justiça. A única justiça é para os empresários que investem bilhões", disse Ambrósio Vilhalva, que representa Nádio, o chefe guarani que lidera a revolta.Bechis declarou que seu filme mostra que a cultura dos indígenas não desapareceu, apesar de eles frequentemente usarem roupas ocidentais ou tingirem o cabelo.
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Quanto ao “Milionário”, o filme que ganhou o Oscar, confesso que fiquei desapontada, talvez por expectativa superdimensionada.

Interessante observar os traços da influência do diretor brasileiro Fernando Meirelles sobre este filme. É (quase) um ‘Cidade de Deus” indiano, mas tem o mérito de contar a história de uma forma criativa, através de um espetáculo de TV de perguntas e respostas cujos prêmios, aos acertadores, são milionários.


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