Quando vim morar num vilarejo nunca imaginei que seria tão intenso e complexo. Sempre associei a vida numa cidadezinha com as imagens suscitadas por palavras como estas
“O mundo meu é pequeno, Senhor. Tem um rio e um pouco de árvores. Nossa casa foi feita de costas para o rio. Formigas recortam roseiras da avó. Nos fundos do quintal há um menino e suas latas maravilhosas. Todas as coisas deste lugar já estão comprometidas com aves. Aqui, se o horizonte enrubesce um pouco, os besouros pensam que estão no incêndio. (Manoel de Barros)
Não é bem assim, embora eu veja por aqui rios, besouros e quintais. Não me dera conta, a princípio (embalada pelo entorno paradisíaco e pelo tamanho liliputiano do lugar), que por onde passa a respiração humana, é inevitável que se inspire junto a miríade de emoções, ilusões e afins que nos torna tão peculiares enquanto seres. Onde existe o humano, paira a complexidade, uma palavra que é bom lembrar, vem do latim complexus que significa o que é tecido junto (e não complicação). Escuto falar neste conceito de pensamento complexo há anos, mal tenho idéia do que realmente significa, mas deu para compreender que se trata de uma integração entre o pensamento linear e o pensamento sistêmico. O primeiro (também chamado de cartesiano) se baseia na repetição, no mecânico. Não é mais suficiente, como foi no início da industrialização e dos tempos modernos, para explicar a rede de sistemas que interagem e se interpenetram incessantemente ao nosso redor e dentro de nós. A avalanche de informação, a proximidade que a globalização nos traz de lugares e eventos antes remotos (quem não se lembra de ter visto as torres gêmeas ruírem na sessão da tarde e a guerra do golfo jogar mísseis nos nossos pratos na hora do jantar?) exige, mais do que nunca, muita conversação, interação e aceitação das diferenças de pensamento e atitude. Sinto que precisamos ter uma postura dinâmica diante da vida, deixar a porta da mudança de opinião sempre aberta e os olhos arregalados para cada momento que vivemos. Ninguém consegue viver o tempo todo assim (só os iluminados, dizem), mas é preciso procurar escapar de regras rígidas e das fórmulas reducionistas para tentarmos entender o mais simples dos conflitos.
Santo André da Bahia, rezai por nós, os que andam tropeçando na escuridão.--------
Enquanto espero pela luz do Santo, um momento da poesia de Ted Kooger
"Esta noite, sentei-me ao lado duma janela aberta
e li até já não haver luz e o livro
se ter tornado nada mais que um pedaço das trevas.
Podia ter ligado facilmente um candeeiro,
mas quis levar este dia até ao fundo da noite,
sentar-me sozinho e acariciar a página ilegível
com o fantasma cinzento pálido da minha mão."
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a foto do rio é de Gisela Muller e da moça com livro é de Rita Magalhães
2 comentários:
Lindo isso q escreveu Olimpia, misturando sabiamente as letras... Amém... que a Luz esteja sempre dentro de nós iluminando nossos caminhos...
Bjooo e Saudades da Luz desse sol que brilha sempre por aí.
Maria, que boa surpresa!
Há tempos você não aparecia...
Vem para Santo André no verão?
bjks
olimpia
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