segunda-feira, 11 de abril de 2011

Fazer o quê em São Paulo?

Quando essa fotografia apareceu na tela do meu computador me deu contentamento: eu estava justamente procurando imagens de redes para usar no blog. Que sorte, encontrei uma redefurada esteticamente impecável -- ficou no cabeçalho do blog durante meses...   O autor da foto, Thomas Farkas, nasceu em Budapeste e mudou-se para o Brasil nos anos 1930.  Participou do grupo que retratou a urbanização do país na década de 50 e que se destacou pelas imagens construtivistas. Faleceu recentemente, em casa, aos 86 anos.  Esta semana fui até o Instituto Moreira Salles, um espaço de arte que fica em frente à Praça Buenos Aires, para ver uma mostra do trabalho dele. Saí do metrô na estação Consolação e fiz o resto do trajeto a pé, interessada em observar os recortes da paisagem urbana e o movimento das pessoas nas ruas.  Adoro andar a pé em dia fresco e ensolarado como aquele.  Por morar a maior parte do ano num vilarejo de escassas ruas e população, no começo de temporada fora da praia sinto um quê de fascínio e curiosidade no burburinho da cidade – quando me canso da agitação volto  correndo pro  meu aconchego de Santo André da Bahia.  Mal entrara na primeira sala da exposição, notei dois homens parados em frente às fotografias que Farkas fez de Brasília,  logo após a inauguração da nova capital. Um deles usava uma bengala e chapéu panamá escuro; falava português com sotaque de estrangeiro. Faziam comentários próprios dos entendidos em arte e eu tratei de tirar proveito da situação privilegiada. Fui seguindo-os pela exposição, procurando disfarçar do melhor modo possível. Valeu a pena ouvi-los, a conversa entre os dois foi instrutiva e interessante.  Aula grátis
escadaria da galeria Prestes Maia, retratada por Thomas Farkas
Naquele mesmo dia eu ainda iria ter o prazer de ouvir uma sinfonia e um concerto de Beethoven na companhia de Ana – foi ela que conseguiu os ingressos para nós.  Era a primeira noite de apresentação , na temporada de 2011, do maestro francês Yan Pascal Tortelier, o regente principal da OSESP.  Combinamos de nos encontrar às 20:30, na entrada lateral. Eu planejara tomar um táxi, mas quando olhei a lerdeza do trânsito achei por bem me apressar: entrei num vagão da linha azul do metrô e consegui descer na Estação da Luz vinte minutos depois – uma proeza que táxi algum conseguiria repetir.  Meu segundo problema logístico foi caminhar sozinha e com a noite já descida, desde a estação de trem até a Sala São Paulo, na praça Júlio Prestes. Os sapatos me apertavam os pés -- o que não era grande transtorno visto que o percurso não era longo -- mas eu teria que passar pelo miolo da região conhecida como Cracolândia. O trecho mal iluminado fica na rua Mauá,  apertei o passo, embora não tenha visto nada inesperado  – algumas prostitutas caminhavam de um lado e do outro da calçada; uma ou outra figura remexia nos cestos de lixo; de vez em quando um corpo deitado no chão.  Rapidamente cruzei o viaduto que passa por cima das linhas dos trens – dali em diante a rua é bem iluminada e os transeuntes não são raros. Uma vez instaladas nas nossas cadeiras, a Ana me apontou o camarote onde estava o FHC – atrás dele, um dos donos do Banco Itaú. De forma que foi uma noite de deleite musical e aguda verticalidade social.
Ontem à noite foi a vez de assistirmos à peça “Marulho: O caminho do rio”, do Grupo Redimunho de Investigação Teatral.  É a terceira montagem do grupo inspirada na obra de Guimarães Rosa.  O teatro é um antigo sobrado na Rua Álvaro de Carvalho, no coração do centro velho de São Paulo.  À medida que a peça se desenvolve os atores e a platéia peregrinam por quatro aposentos – a cenografia se espalha por todo o casarão.  O espetáculo procura mostrar o mundo e as tradições da gente simples do interior envolvido num clima mágico e fabular -- os personagens parecem suspensos entre o real e o imaginário.  Além da trama, há cenas entremeadas por diálogos sobre os conflitos vividos pelo grupo durante a construção do espetáculo, com pungentes e doloridos questionamentos do “ser ator” e “ser ficção”.  A idéia é boa, mas confesso que achei tudo muito monótono...
O melhor da noite foi encontrarmos as sobrinhas Carol e Mônica, em frente ao Espaço Unibanco. Descemos a Rua Augusta num “busão” (como elas falam) e depois caminhamos um bocado, passando por um trecho meio tenebroso e por outro lindinho: a pequena e sinuosa Rua Avanhadava.  Há poucos anos ela passou por uma grande reforma. Logo na entrada pela rua Martins Fontes, tem duas colunas de pedras e duas fontes. As calçadas foram rebaixadas e duplicadas. O ponto de táxi e a banca de revistas que estavam ali desapareceram; foram plantadas 28 árvores e o piso é um capítulo à parte. Não há mais bocas-de-lobo. A chuva é absorvida pelos pequenos vãos deixados entre os blocos do piso.   A rua é gastronômica, há barzinhos descolados e restaurantes como o legendário “Famiglia Mancini, famoso pelos generosos pratos de massas e longas filas de espera.

São Paulo é mesmo uma colcha de retalhos.

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