terça-feira, 2 de junho de 2009

Vida de pescador


Os pescadores estavam de partida para o alto mar quando escutaram os gritos de socorro! socorro!

Voz de mulher.

Aturdido, o homem que puxava a âncora deixou-a cair novamente na água do rio João de Tiba. Do convés do barco dava para ver bem a cena. Estavam próximos à margem, perto da igreja evangélica.
Um homem e uma mulher. Não são casados, talvez por isso a platéia resolveu meter a colher. Dois pescadores saltaram do barco e nadaram em direção à terra. O homem que brigava agora tinha um cabo de enxada na mão e batia com ele na cabeça e nos braços da moça -- que fazia o maior estardalhaço.
Conseguiram trazer a mulher para o barco e levá-la para ser socorrida em Cabrália.
A pescaria atrasou.
O agressor fugiu: por ironia nefasta, trabalha no Centro Médico.
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Na volta do mar, dois dias depois, novo incidente, novo pedido de ajuda. Ouviram o SOS pelo rádio, quando já estavam chegando na Coroa Alta, quer dizer, a uma hora de casa.

Tiveram que voltar: é a etiqueta do mar.

Horas para ir, horas para voltar. Encontraram os marujos em apuros (quatro) apinhados dentro de um barco minúsculo; o motor de um cilindro (não vale nada) avariado, só uma velinha içada; inutilmente, porque vento nenhum havia.
Já estavam perto de Belmonte, provavelmente seriam arrastados pela correnteza até Ilhéus.
Tiveram sorte: voltaram rebocados.
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Esses mesmos pescadores (os que socorreram a moça e o barco sem motor) decidiram inovar. Em vez dos biscoitos e sanduíches costumeiros, levaram temperos frescos – tomate, cebola, pimentão – e arroz, e fogão, e fósforos, e sal, e farinha para o pirão.
O peixe, pegariam lá, no alto mar.
Deu certo: deu peixe. Muito peixe; mas esqueceram de levar a panela.
A fome atormentou o dia todo; de madrugada avistaram uma luzinha longe, no Rego do Braço. Foram até lá pedir a panela emprestada e comeram moqueca no café da manhã.
Esse negócio de boa vizinhança funciona até na água salgada.

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