Acabei de sair de casa para comprar alho no mercado e me deparei com um dia esplendoroso, claro e brilhante. Nenhum sinal de chuva, nevoeiro ou poluição descarada. Dias assim são rotineiros em Santo André, mas aqui em São Paulo é uma benção, é para comemorar e curtir, principalmente depois da onda de enxurradas que desabou em janeiro passado. O prazer que as coisas nos oferecem depende muito de seu contexto. Era este ponto de vista que eu tentava explicar para uma senhora estrangeira que tem passado meses de vida entre nós. Eu a ouvi se queixar da qualidade do som que rolou no Malembá na véspera da partida. Claro que entendo o que ela quer dizer, sei que o grupo musical do povoado se caracteriza pela mutabilidade extrema e um domínio desigual da técnica: alguns conhecem música de fato, outros passam longe. E acontece de repente, não mais que de repente. Falo assim de ouvido, porque conheço música muito mal. Mesmo assim, acho extraordinário quando escuto um caco de vidro, de vida e de sol na noite silente de Santo André. As notas repercutindo na escuridão, mesmo se dissonantes, traz uma coisa cálida para o peito da gente, porque é inesperada, chega como um presente. É um sentimento diferente daquele outro tipo de prazer – indiscutível – que sentimos quando ouvimos uma orquestra sinfônica, uma boa banda de rock, uma virtuose jazzística. Vou procurar me lembrar disto, no caso de ser eu a reclamante, a olhar sempre o contexto para valorizar o pontual. Ou não: se um dia eu for à Viena ou a Salzburgo não admito ouvir música pobre.
Só mais uma nota: meus ouvidos agradecem quando o som se origina em saxofone (acho que só tem o Jean-François), gaitas, tambores, guitarras, flautas e violões de Santo André. No caso de música brega e estridente, ou aquela coisa horrenda que vem dos porta-malas dos carros de pessoas mal educadas, concordo com a visitante, não tem perdão, os adeptos deveriam ouvir entre as 4 paredes das casas deles.
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