terça-feira, 16 de março de 2010

os objetos na Literatura

"A cômoda foi comprada em segredo, e introduzida ocultamente. Que dia de felicidade para Juliana! Não se fartava de lhe saborear o cheiro da madeira nova! Passava a mão, com a tremura de uma carícia, sobre o polimento luzidio!… Forrou-lhe as gavetas de papel de seda; e começava a completar-se."

O Primo Basílio, Eça de Queirós
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"Uso uma máquina de escrever portátil Olympia que é leve bastante para o meu estranho hábito: o de escrever com a máquina no colo.
Corre bem, corre suave. Ela me transmite, sem eu ter que me enredar no emaranhado de minha letra. Por assim dizer provoca meus sentimentos e pensamentos. E ajuda-me como uma pessoa. E não me sinto mecanizada por usar máquina. Inclusive parece captar sutilezas. Além de que através dela, sai logo impresso o que escrevo, o que me torna mais objetiva. O ruído baixo do seu teclado acompanha discretamente a solidão de quem escreve. Eu gostaria de dar um presente à minha máquina, mas o que se pode dar a uma coisa que modestamente se mantém como coisa, sem a pretensão de se tornar humana? Essa tendência atual de elogiar as pessoas dizendo que são ‘muito humanas’ está me cansando. Em geral esse ‘humano’ está querendo dizer ‘bonzinho’,afável’, senão ‘meloso’. E é isso tudo o que a máquina não tem. Sequer vontade de se tornar um robô sinto nela. Mantêm-se na sua função, e satisfeita."

Gratidão à máquina - Clarice Lispector

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