domingo, 2 de novembro de 2008

Luz silenciosa

Ontem à noite eu refletia sobre a dificuldade de se trabalhar com entretenimento.

Trabalhar, direis, ora, ora, pois, pois, então ver e passar filmes é trabalho? É, sim, e como! Manter o equipamento de exibição em ordem – transportar, montar, operar, os consertos, comprar, assistir e selecionar os filmes – tudo isto embute um tempo escondido dentro da tela, quando, às vezes, tudo o que se deseja é ir à praia ver o vento mover as ondas do oceano ou ondular a folhagem das árvores.
Nem sempre é desejável ficar no escurinho do cinema quando a luminosidade de fora perpassa pelas frestas das persianas.
Mas, enfim, lá fomos nós, Cláudio e eu, para mais uma sessão de sábado à noite no Casapraia. Pensávamos que com a vila quieta e ainda em baixa estação, a platéia seria a mais íntima possível, aquela meia dúzia de tarados por cinema a qual já nos afeiçoamos tanto, então levamos um filme difícil, como bem explica a crítica no post acima.
Qual não foi nossa surpresa, de repente, não mais que de repente, a casa encheu. O jovem casal, recém-chegado para morar em Santo André, o sobrinho do amigo italiano, o casal de Arraial de Ajuda com a filha, os novos baianos que aportaram este ano, um casal de hóspedes do Guiau, o povoado vizinho, e nós, os de sempre.

Respirei fundo e lamentei internamente não termos levado um filme mais tradicional. Esse pessoal prefere filme de ação, pensei... E ação, definitivamente, não é o caso da Stellet Licht, o título original da película. Também não tem roteiro dinâmico, cortes contínuos, reviravoltas a cada quadro, música pop, montagem pós-moderna...Ainda por cima, um dos temas principais é o tempo, quer algo mais metafisico?
Pesa, ainda, a responsabilidade para com os donos da casa, que nos deixam à vontade para traçar a nossa diminuta curadoria.

Na próxima encarnação quero trabalhar em área mais tradicional, quem sabe no Banco Central, lá no Planalto Central.

De alívio, só saber que “o mestre” adorou. E ainda ilustrou minha ignorância sobre a aparição de um chansonnier francês em determinada sequencia do filme: aquela onde as crianças assistem, em companhia de um fulano surgido do nada, um musical na TV em preto em branco, dentro de um furgão da fazenda. Quando assisti o filme em São Paulo, pela primeira vez, fiquei curiossíma para saber quem seria o cantor, pensava que era o Boris Vian. Pesquisei em mil sites, inclusive em inglês e francês: nada. Perguntei ao mestre, meio sem esperança, e a resposta foi imediata: Jacques Brel, compositor de Ne me quite pas. E ainda sabia a vida toda do cara. Pois é, internet pra quê, se temos fonte local.

Para compensar, hoje quero um dia bem baiano: comer goiamum na barraca do Léo no Guaiú, ver Regina e Maria Nilza, depois ir para o aniversário de Stefano Arosio, na casa do Giampi em Mojiquiçaba, conversar com o povo todo, e, quem sabe, até ouvir axé.

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